Oração para a Festa Comunitária de 2022
Neemias 8, 1- 12
Era um dia de festa em Jerusalém, por volta de meados do século V a.C., quando o povo "como um só homem" se reuniu na praça em frente à Porta da Água que conduz ao Templo. O Livro da Lei de Moisés, ou seja, a Palavra de Deus, voltou ao povo, em frente da assembleia "de homens e mulheres e de todos os que podiam ouvir". Uma grande festa, para todos, cheia de gratidão porque o Livro, nunca perdido, voltou à presença de todo o povo. O tempo do exílio e a relativa dispersão em que a assembleia não se reuniu tinha passado. A Palavra existia mas não era para todos, não era lida e comentada na assembleia. Já não estavam habituados a ouvi-la juntos como um povo. Esse dia foi um dia de gratidão e espanto. O povo estava finalmente reunido. A Palavra faz a unidade do povo. E dessa unidade emergiu uma resposta comum: amém, amém. É a aclamação do povo que diz: é verdade! Reconhecem assim essa Palavra como a verdade para as suas vidas.
É hoje uma festa em Santa Maria in Trastevere e em todas as nossas comunidades, ao celebrarmos o aniversário do seu nascimento a 7 de Fevereiro de 1968. Num dia de Inverno, uma pequena comunidade reuniu-se com o Andrea para escutar a Palavra do Senhor e a sua explicação: a palavra pedia para passar da solidão à amizade. E nesta amizade tinham de existir os pobres. Essa palavra tocou o coração, ou como disseram os discípulos de Emaús, fez arder os seus corações. Pela graça do Espírito Santo essa palavra já era para todos nós, não se deteve dentro dos limites de uma pequena comunidade, uma pequena realidade. "Nem tudo estava claro no início... mas tudo estava na Palavra do Senhor" - escreveu Andrea sobre os inícios da Comunidade, mas acrescentou: "Sant'Egidio é mais Sant'Egidio hoje do que ontem... a Comunidade está um pouco mais enraizada na história e um pouco mais imersa na Palavra de Deus". Sim, porque a Palavra foi além das fronteiras e tocou o coração de um grande povo composto por pessoas tão diferentes em idade, origem, descendência, cultura e tradição. Essa palavra tornou tantos, diversos e dispersos, num só povo reunido "como um só homem", como em Jerusalém.
O Concílio Vaticano II tinha acabado de terminar. A Palavra de Deus tinha voltado para as mãos do povo que agora podia experimentar o seu poder porque, como diz Gregório o Grande, "a palavra de Deus cresce com aqueles que a lêem". Quanto mais se compreende, mais se presta atenção ao que se lê. Se a pessoa não se elevar, nem mesmo as Escrituras se elevarão. Se, por outro lado, um homem procura na palavra de Deus aquilo que o faz viver bem, e dá um passo com o seu coração, a compreensão da Escritura também será maior".
O livro de Neemias diz-nos que os Levitas explicaram o significado da Palavra e assim fizeram compreender a leitura. Os Levitas, um grupo de leigos, não de sacerdotes, que comunicam a Palavra de Deus a todos. Quais são hoje as nossas Comunidades de Sant'Egidio, irmãos e irmãs, se não isto em todas as partes do mundo? Levitas, leigos, que comunicam a Palavra de Deus ao povo e dizem: "Não fiques triste, pois a alegria do Senhor é a tua força".
A Palavra de Deus traz-nos a alegria do Senhor, o que nos dá força. Aquela força que nos falta quando estamos sozinhos, concentrados em nós próprios, dispersos. A Palavra de Deus reúne-nos num povo do qual ninguém é excluído, porque a Palavra é para todos. A Palavra de Deus dá-nos força porque é a luz que ilumina os nossos passos e nos guia por um bom caminho. A Palavra de Deus diz-nos que encontramos Jesus nos pobres, nos solitários, nos que não têm comida nem roupa, nos que estão na prisão, nos que estão doentes. Esta é a garantia da nossa amizade com os pobres. A Palavra diz-nos que o primeiro e maior mandamento é o do amor, e ensina-nos, a nós que não sabemos amar, a amar todos os dias e assim a vida muda.
Gregório o Grande diz novamente: "amando eles aprendem o que ensinando eles comunicam". Compreendemos melhor a Palavra de Deus quando a comunicamos aos outros com paixão. Sim, a Palavra de Deus pode ser compreendida em conjunto: "muitas coisas na Escritura que eu não compreendia por mim mesmo, compreendi ao pôr-me à frente dos meus irmãos".
É por isso que celebramos hoje: desde aquele 7 de Fevereiro e em todos os momentos e lugares onde a Palavra de Deus ressoou entre os irmãos - mesmo que apenas dois ou três - a Palavra tem sido compreendida e posta em prática. Sim, é apenas colocando-me perante os meus irmãos que compreendo o que o Senhor me está a pedir. Nos últimos anos, portanto, uma coisa tornou-se clara para nós: os irmãos e irmãs não são apenas aqueles que conheço ou que são frequentes, são todos. Esta é a perspectiva deste aniversário: todos os irmãos e irmãs.
Neemias diz: "Todo o povo saiu para comer, beber, enviar porções, e regozijar-se com grande alegria, porque tinham compreendido as palavras que lhes tinham sido proclamadas". Este é o significado de uma festa cheia de alegria, onde a todos é dado algo para comer. Esta é a verdadeira festa que o Senhor quer: onde a Palavra é compreendida, há grande alegria e o pão é distribuído a todos, ninguém excluído. Esta é a festa da nossa Comunidade hoje: alegria e gratidão por ter recebido e compreendido a Palavra de Deus num povo e por ter aprendido que todos são nossos irmãos e irmãs com os quais podemos partilhar o pão da amizade e do dom.
Rezemos hoje, de uma forma especial, pela Comunidade para que esta seja protegida de todo o mal.